sábado, 23 de outubro de 2010

Quereres



Abri a janela do ônibus noturno fazendo o vento gelado soprar as nuvens do azulado das minhas unhas. O ar entrou pelas mangas maduras da minha camisa cansada, fez esfriar. É contínuo o anseio de um cobertor de pele nos transportes urbanos. Deparo-me com certa frequência irritante os casais adocicados que transformam bancos em movimento rastejante um pedaço de nuvem sem céu. Nesses relances permito-me querer. Querer um cabelo quente no meu colo frio pra fazer neblina com as próprias mãos. Esquentar o espelho à dois e enxugar o beijo com calma. Aguar as horas, pelejar com as filas, chutar algumas pedras sem sapato e poder sorrir ao telefone, desmembrando o dia em notas no ouvido mais aveludado. Escrever conselhos no cobertor, encher a estante com verbos novos e compartilhados, transbordar a panela com algum tempero que faça memória. Alguém pra dividir afeto. Alguém que queira querer.

Diana M.

Um comentário:

  1. Texto bonito, com doses sutis de dor nesses quereres. São quereres comuns, nosso lado humano gritando que é todo mundo igual.

    Parabéns pelo novo começo, mais uma vez, de novo, novamente. rs Beeeijos!

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