Agri-doce
domingo, 25 de novembro de 2012
Au revoir
Abandonei-me quando lhe abri a porta. Essa sensação de te ser pouco, rasa, detalhe com ares bonitos, traiu-me o caminho. Perdoe-me por desistir de mim, de te querer assim. É verdade, você me avisou que dormia nos lençóis terrenos. Que sua morada não tem telhado e eu teimei em querer secar seus dias da chuva. Eu sempre tão pequena, tão medrosa, tentando correr até o fim do calendário e você sem se importar se é terça ou domingo. A raiz da mangueira não é rosada como a fruta. Quando finca, faz morada, fere a terra que lhe acolhe piedosamente. Cansei do peso do cheiro da terra em mim. Artérias e poros engasgados todas às vezes que compra as passagens de vinda. "De tanto bater meu coração parou".Acabou o que nem início teve. Talvez lhe mande notícias boas daqui uns tempos, mas sempre fica a desconfiança de não ter um destinatário para os postais. Saudades suas, sempre, e de um inverno que nem tirou o casaco do armário.
Não volto mais pra essa morada, inté.
sexta-feira, 14 de setembro de 2012
Dama
Era seu aniversário e nem te liguei, comemorei gemendo, já sem calcinha, na cama de um antigo vizinho. Você sabe que meus impulsos são meras fugas carnais, vãs, lembranças que nunca tive com seu corpo. Jurei-te amor incondicional, comprei véu e grinalda, aprendi receitas de bem-casado, sempre tinha sua cerveja sagrada na geladeira, mas nada lhe era suficiente. Sempre me pressionando, perguntando nomes e endereços. Pra quem me perfumava, o porquê das unhas tão vermelhas, ou até mesmo, de onde surgiram esses três hematomas na virilha tão branca e tão impura. Lembro do dia que chamou-me de puta cuspindo
rancor, e quando desesperada sorri respondendo que gozava com eles lembrando do seu cheiro, se zangou.
Quase um texto-resposta pra Lady de Darlan C. no palavrasobliquas.wordpress.com
terça-feira, 10 de julho de 2012
Você
Queria dormir onde você mora, saber da cor do seu travesseiro, do seu café matutino e da cerveja na geladeira. Espreguiçar suas janelas manhosas e beijar seus olhos toda manhã. Essa vontade constante de moldar seu contorno morno com a palma da mão, com o meio do cobertor sem o barulho do ventilador de teto. Te amo um tanto de vezes que nem sei ao certo o que isso quer dizer nos seus dias. Te quero um tanto de tempo que nem seu relógio aguenta. Te observo durante vidas inteiras, não te aguardando, mas criando-te em festa, orgias vãs, ônibus apertado. Te querer me consome os pulmões e você nem cigarro é.
segunda-feira, 28 de maio de 2012
"Eu quase não soube ser sozinho"
Darlan C.
Texto de minha autoria inspirado nessa frase.
E quase acreditei que seríamos aquele verão nublado. Naquelas tardes onde seu peito largo cheirava a maresia e meus pés afundavam nas almofadas úmidas, éramos somente nós e o caos. Mel e picada de abelha no café da manhã. Meus sapatos bagunçando sua ordem, seus versos brancos escorrendo pelos ouvidos sonolentos. O ronronar manhoso do meu hálito a fazer pedidos absurdos antes do seu dia engarrafar. Éramos o ardor sem ao menos sermos. Eu era a sua pequena, você meu pedaço de cor. Não coubemos dentro da cama. Sua geografia incerta me confundiu, meu riso sádico te cegou. Até que acabou sem ao menos começar, sem deixar os dois pratos na mesa, o casaco no cabide, o bilhete na geladeira. Meu erro foi acreditar, nosso erro foi começar.
Darlan C.
Texto de minha autoria inspirado nessa frase.
E quase acreditei que seríamos aquele verão nublado. Naquelas tardes onde seu peito largo cheirava a maresia e meus pés afundavam nas almofadas úmidas, éramos somente nós e o caos. Mel e picada de abelha no café da manhã. Meus sapatos bagunçando sua ordem, seus versos brancos escorrendo pelos ouvidos sonolentos. O ronronar manhoso do meu hálito a fazer pedidos absurdos antes do seu dia engarrafar. Éramos o ardor sem ao menos sermos. Eu era a sua pequena, você meu pedaço de cor. Não coubemos dentro da cama. Sua geografia incerta me confundiu, meu riso sádico te cegou. Até que acabou sem ao menos começar, sem deixar os dois pratos na mesa, o casaco no cabide, o bilhete na geladeira. Meu erro foi acreditar, nosso erro foi começar.
domingo, 1 de abril de 2012
Moreno e os três nós

- Já ia esquecendo, trouxe uma lembrança pra você.
Ruborizada fingi que não precisava se incomodar ou até mesmo lembrar de mim (mentira). Transbordava todas às vezes que dizia lembrar de mim ou algo relacionado ao meu gosto.
- Trouxa da última viagem trouxe essa fitinha e como sempre fala dos seus desejos, suas vontades, resolvi ajudar.
Coloco meu punho à mostra , diz que preciso fazer três pedidos. Um a cada nó.
A tarde de esvai em conversas bobas, planos, risadas dos outros e de nós mesmos. Começou esfriar, convenci-o a tomar um banho (ainda tinha uma muda sua nas minhas coisas). Quando saiu do banheiro envolto no vapor morno do chuveiro, embaçando a janela, por um instante senti a lembrança da quentura dos seus braços. Dos dias que ligava pra desejar um bom dia, das cartas que te deixava ao pé da cama, da minha mania de café e da sua cerveja sagrada. Daqueles dias que feneceram comigo acordada e nem dei por mim. Por um momento recordei no nó da garganta a saudade que me fazia engolir. E, Meu Deus, não era pouca. Era um tanto que se fazia palpável em mim. Aquela sensação pesou o ar que ao entrar nos seus pulmões largos, afundou.
Deitou ao meu lado, pegou nas minhas mãos argumentando elogiar a cor das minhas unhas. E de relance, disse:
- Também sinto sua falta.
Como sempre orgulhosa, perguntei com sorriso sarcástico:
- Como assim "também"?
- Tem razão, posso falar da minha saudade somente. Da falta que você me faz, e na verdade, nem sei a razão de esperar tanto pra te dizer isso.
Fiquei sem resposta como sempre. Pra descontrair, perguntou:
- Pode me contar dos três pedidos? Juro que não sai desse quarto.
Olhei pro próprio pulso, levei uns dois minutos fingindo pensar, criando expectativa. Disse que o primeiro pedido era que ficasse a tarde inteira ao meu lado. E havia se concretizado. O segundo era tomar um grande sorvete de menta com chocolate que há tempos não tomava. Levantou apressado, colocou os sapatos e carinhosamente disse que meu segundo pedido seria realizado agora mesmo. Sorri tão intensamente que abriu o tempo lá fora. Coloquei os sapatos, peguei a bolsa e quando abri a porta:
- Hei, não me contou o terceiro.
- O último tem que ser segredo. Quem sabe daqui um tempo te conto?
O último era que não passasse somente a tarde ao meu lado, e sim, a vida inteira ou um bom pedaço dela.
terça-feira, 20 de março de 2012

Fez-se mais turvo que um filme coreano sem tradução. Compreendi somente suas nuances sem falas. Optei tatear o caminho de casa com a ponta da língua sonolenta pela cor morena da pele. O avesso dos meus traços encurralou-me no silêncio das despedidas, o desapego costumeiro. A ausência de dedos entrelaçados, as pilhas de lençóis sujos, o sebo dos dias sem rumo entupindo o ralo. Tirou-me pra dançar nessa troca de pés e sapatos, sem música, sem ritmo. Mas eu falo melhor com os dedos do que com a própria boca. Recitei o dicionário em braile completo sem hesitar enquanto a água do café secava a sua espera diária. Escrevi 5 anos de cartas, bilhetes, telegramas, mas nunca pedi seu endereço por saber que nunca teria altura na ponta dos pés pra alcançar a campainha. Creio que seja essa a razão de ter plantado um quintal sem portão, sem tranca, sem a infantil esperança de sujar seus pés com terra.
terça-feira, 24 de janeiro de 2012
Logo chega

"Poderia tecer intermináveis dizeres afagando seu ego, fazendo-o transbordar no meu colo, mas isso nunca te trouxe. Talvez uma nova estratégia, um novo argumento ou segredo confessado o faria lembrar relembrar de mim. Longe, mas sempre aqui. Não vou dizer que a sua espera, soaria dramático demais até para mim. Mas, você sempre esteve presente nas minhas escolhas mesmo não estando ciente do meu argumento..."
Trecho retirado de uma carta que ainda não mandei.
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